O cotidiano
de moradores de cidades que vivem colapso no abastecimento d'água na
Paraíba tem sido de filas, disputas e muita discussão.
O conflito é
inevitável na hora de conseguir água para beber, cozinhar e fazer as
atividades domésticas diárias nos municípios que não dispõem mais de
água nas torneiras porque os mananciais que abastecem a população
secaram.
Quando há
colapso no abastecimento, todos ficam dependendo da água obtida pelas
prefeituras, transportadas em carros pipa e colocadas nos reservatórios,
que são caixas d'água que ficam espalhados em pontos estratégicos da
cidades.
Diariamente,
a distribuição é feita por ordem de chegada e filas são formadas. Nem
sempre elas são construídas de forma amigável e as discussões são
inevitáveis.
Dona Maria
Auxiliadora, de 55 anos, mora no Centro de Diamante, município do Sertão
a 450 quilômetros de João Pessoa, que possui cerca de 8 mil habitantes.
Todos os dias, ela procura uma das caixas d'água com um balde na mão
para não faltar água para ela e quatro filhos.
"Todo dia
tenho que fazer isso sozinha, pois tenho quatro filhos, mas eles têm
deficiência mental e não podem me ajudar", lamenta. Ela é viúva e
percorre uma distância de 500 metros todos os dias para pegar o produto
em um balde de 20 litros que coloca na cabeça.
Dona Maria Auxiliadora conta que discussões sempre acontecem porque as donas de casa querem conseguir água o quanto antes.
Com apenas
um balde de 20 litros, ela usará a água para fazer comida, para beber,
dar banho nos filhos e usar nas demais obrigações domésticas.
"É uma luta
diária. Muito trabalho, mas não temos outra forma. Não tem água nas
torneiras há meses e só conseguimos um pouco com muita luta e trabalho.
Temos que agradecer a Deus, pois sem essa que nos chega, seria muito
pior", se consola.
Em
Diamante, existem várias cisternas espalhadas pela cidade para abastecer
a população. As caixas de águas dispõem, cada uma, de cinco mil litros.
A água distribuída é retirada de poços perfurados pela Prefeitura.
A
Prefeitura tem se preocupado em conseguir água somente para quem mora na
Zona Urbana. Na Zona Rural de Diamante, a população é abastecida pelos
carros pipas do Exército que trazem água do açude Piranhas, localizado
no município de Ibiara, também no Vale do Piancó.
A situação
fica preocupante porque, as localidades já abastecidas pelo manancial,
também já estão sob ameaça por conta do baixo nível das águas. Com
capacidade para acumular 25,6 milhões de metros cúbicos (m³), o Piranhas
está com apenas 8,7 milhões de m³, ou seja, 33% da capacidade.
Baldes e latas
No
município de Boa Ventura, no Sertão do estado, a 371 quilômetros de João
Pessoa, foram colocadas seis caixas de água em toda a área urbana.
Um caminhão
e um trator fazem o transporte de água para abastecer os moradores da
cidade. São feitas três viagens por dia. Cada veículo tem capacidade
para transportar até cinco mil litros que são depositados nas caixas e
depois distribuídos à população.
Além dos
moradores que chegam diariamente para pegar água desses reservatórios e
encher baldes e latas para levar para casa, os caminhões distribuem o
produto também para as escolas, postos de saúde e creches da cidade.
Quando é
feita solicitação de água por algum órgão ou Secretaria do Município, o
produto trazido é prioritariamente fornecido às instituições e as caixas
de água que abastecem a população aguardam uma nova remessa.
A água que
está sendo distribuída em Boa Ventura vem de um poço artesiano perfurado
na Zona Rural e do açude 'Cantinhos' na cidade de Itaporanga, que fica
na mesma região, segundo informou o secretário municipal de Transporte,
Janairson Pereira.
O manancial
foi o único recurso encontrado porque o Município não tinha mais de
onde tirar água para abastecer a população. Mas para isso, foi preciso
enviar ofício à Defesa Civil pedindo a permissão para a retirada do
produto de lá.
Até quando
Boa Ventura poderá contar com o manancial de Itaporanga, ainda não se
sabe porque, como todos os reservatórios da região do Vale do Piancó,
ele está também com nível baixo e a população do município vizinho tem
reclamado da retirada de água para outras cidades. Os moradores de
Itaporanga estão sofrendo racionamento e temem que a situação piore a
ponto também do município entrar em colapso.
Qualidade
A água que é
distribuída em Boa Ventura é preparada para o consumo apenas com a
colocação de uma pastilha de cloro. Ela é retirada do açude e, dentro do
caminhão tanque, é colocado a solução para derreter durante o
transporte. Este é único procedimento feito para transformá-la em água
boa para o consumo humano.
Diariamente,
os motoristas percorrem cerca de 20 quilômetros para buscar água no
açude Cantinhos, em Itaporanga, e abastecer os moradores de Boa Ventura.
O acesso é difícil e muitas vezes o veículo apresenta problemas
mecânicos que inviabilizam o transporte.
Quando
acontece isso, a distribuição fica prejudicada e a população precisa
esperar o problema ser resolvido para poder voltar a ter água.
Motor-bomba
Um antigo
poço cavado pela Companhia de Água e Esgotos (Cagepa) há mais de dez
anos pode ser uma alternativa de abastecimento para a população de Boa
Ventura. Mas para isso, a população está aguardando a Cagepa fornecer um
motor-bomba com capacidade para puxar a água.
O poço com
vazão de 20 mil litros por segundo, foi construído em uma propriedade
privada, mas foi cedido para que a prefeitura do município fizesse o
desentupimento e posteriormente captasse o produto.
"Tivemos a
informação de que chegou um motor-bomba de pequeno porte que está sendo
utilizado enquanto aguardamos o motor-bomba com maior capacidade. Assim
chegando a ferramenta mais potente, a situação de abastecimento vai
melhorar", analisa Janairson Pereira.
A Cagepa
informou que não tem conhecimento desta solicitação. "A título de
esclarecimento, informamos que o atendimento à população de Boa Ventura,
no que se refere ao abastecimento de água por parte da Cagepa,
independe, neste momento, de capacidade de potência de motor-bomba. O
problema é a deficiência de vazão dos poços, ocasionada pela escassez de
água na região", informou.
Ainda
segundo a Cagepa, por conta da estiagem, a Agência Executiva de Gestão
das Águas (Aesa) fechou as comportas do açude Bruscas, que alimenta os
poços da região.
"Devido à
estiagem e para evitar a exaustão do manancial, a Aesa fechou as
comportas do açude Bruscas, que alimenta estes poços. Com isso, não há
água suficiente para o pleno funcionamento deles. Acrescentamos que, em
condições normais, os conjuntos de motor-bomba que estão instalados nos
dois poços operados pela Cagepa, em Boa Ventura, atendem de modo
satisfatório", contou a Cagepa.
Portal Correio