Márcia Rodrigues, de O Estado de S. Paulo
O aquecimento econômico, que vem gerando uma verdadeira caçada de
profissionais qualificados, não impede as empresas de dar prioridade à
avaliação do perfil psicológico dos candidatos, antes mesmo de pesar a
experiência técnica durante os processos seletivos. É o que aponta
pesquisa da Catho Online com 46.067 entrevistados entre candidatos e
profissionais da área de recursos humanos.
De acordo com o levantamento, 52,1% das empresas pesquisadas
aplicam algum tipo de teste no processo seletivo. Destas, 71,7%
valorizam a avaliação da personalidade, aptidão e as competências dos
candidatos em testes psicológicos ou de análise de comportamento durante
a seleção. O conhecimento técnico também é analisado no currículo, em
entrevistas ou em testes situacionais - quando a empresa simula um
conflito do dia a dia da função para ver se o candidato consegue
solucioná-lo -, mas somente depois da aprovação do perfil
comportamental.
"Normalmente, as pessoas são contratadas por suas habilidades
técnicas e são demitidas por problemas de comportamento. Por isso, é
natural que as companhias deem prioridade a este tipo de avaliação.
Afinal, é muito mais fácil oferecer um curso técnico para aprimorar os
conhecimentos do profissional na área e, assim, suprir a sua
deficiência, do que ‘moldar’ a personalidade de alguém", comenta diretor
de educação da Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH), Luiz
Edmundo Rosa.
A gerente de recursos humanos da rede hoteleira Grupo
Salinas, Eliana Castro, concorda com Rosa. Para ela, em muitos casos é
importante avaliar se a personalidade do candidato se encaixa com a dos
demais funcionários da equipe para não prejudicar o clima amistoso no
ambiente de trabalho.
"Há candidatos que nós desencorajamos o chefe do setor a
contratar, porque sua personalidade destoa dos demais da equipe. Claro
que não eliminamos o candidato logo de cara, mas é algo que conta
ponto", diz Eliana.
Recém-contratadas pelo grupo hoteleiro de Alagoas, Natalia
Pinto Rabelo, de 22 anos, e Karina Sencades, de 32 anos, passaram por
vários testes antes de obterem a efetivação.
Por ser psicóloga, Karina, que assumiu o cargo de consultora
de recursos humanos em março, não passou por testes psicológicos, já que
não se aplica este tipo de exame em profissionais da área. "Mas passei
por entrevistas, provas situacionais e de competência, que também
ressaltam características que possibilitam ao recrutador traçar meu
perfil psicológico", conta Karina.
Natália, contratada este mês como assistente de vendas, fez
testes de personalidade, passou por três entrevistas e ainda pela prova
situacional. "De todos os testes, o mais difícil foi a simulação de um
problema corriqueiro da função. ‘Tirei de letra’as entrevistas e o teste
psicológico."
O diretor de desenvolvimento organizacional do Grupo
Boticário, Rogério Bulhões, também não recomenda a contratação de um
profissional que os testes, entrevistas, dinâmica[ ]s etc. apontem que
ele não tem o perfil aderente à cultura organizacional, mesmo tendo a
base técnica. [/ ]"Testes comportamentais são instrumentos que apoiam a
decisão do gestor e complementam a entrevista, dinâmicas de grupo, cases
e outras ferramentas de seleção. Mas não são a única ferramenta para a
tomada de decisão da contratação."
A AmBev também investe na avaliação do comportamento do
candidato. A companhia faz testes de personalidade e de afinidade com a
cultura corporativa.
Lacuna. Dependendo do cargo e da área de
atuação também é feita análise técnica, de português e de inglês. "É
muito mais fácil preencher a lacuna da área técnica do que moldar uma
personalidade", garante a gerente de recrutamento e seleção, Isabela
Garbers.
Para conquistar uma vaga de trainee na área de auditoria da
consultoria BDO Brazil, André Nunes, de 21 anos, também precisou passar
por uma bateria de exames. Enfrentou dinâmica de grupo, testes
psicológicos, redação, entrevistas e simulações de atividades
operacionais. "Passei por vários processos seletivos este ano, mas este
foi o mais difícil de todos", comenta Nunes.
Outra empresa que utiliza testes de personalidade e
entrevistas por competência é a TAM. Segundo informações divulgadas pela
assessoria de imprensa da empresa, caso seja identificado algum desvio
apontado no teste comportamental e na entrevista, mesmo que o candidato
atenda tecnicamente aos requisitos ele é reprovado na seleção.
A Natura não faz testes psicológicos, mas sim uma avaliação
comportamental, que inclui a elaboração de um "inventário de reflexão",
além da análise de competência. Principalmente para vagas que exijam
requisitos mínimos para a função, como um técnico de mecânica ou de
pesquisa, por exemplo.
"Aplicamos um questionário no qual o candidato precisa fazer
uma reflexão sobre as atividades que desempenhou ao longo da carreira.
Também o fazemos refletir se a vaga disputada e a Natura se encaixam nas
suas perspectivas para a carreira. Reforçamos isso durante a entrevista
também", diz a gerente de educação corporativa Andrea Vernacci.